quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Todos os Natais carecem de contos...

O meu Conto de Natal quando corre o ano de 2019, na viragem para uma nova década, num já usado século XXI, não tem nada de luzente e começa assim:
Desde a partida da minha mãe, em 2018, que ando mais poupada nas palavras que aqui publico. Há três ou quatro anos que deixei de escrever contos de Natal, por achar que os existentes são suficientes, num mundo desnutrido e frugal.
Quando uma doença degenerativa nos entra em casa é que percebemos claramente a fragilidade da sociedade atual. No meu caso, sozinha, a braços com a “loucura” de uma demência vascular cerebral. Durante três longos anos, todos os meus sonhos caíram por terra, à medida que a doença e fragilidade humana tomava conta da minha casa, o desemprego foi só mais um passo, e depois do caos, no meu novo recomeçar, valeu-me a garra e os ensinamentos dos homens e mulheres rudes, do campo. No seio dos quais fui criada e amentada, foi neles que busquei a força, na sua imagem, nos rostos cravados de sofrimento e mesmo assim, com muito amor no coração.
Amor e compaixão que repartiam no pouco que tinham, sempre que lhes batia à porta, alguém que tinha ainda menos do que eles. Em criança ou na adolescência, raramente uma pessoa morria sozinha em plena solidão e abandono. Costumo afiançar que sou como os gatos, tenho sete vidas e caio sempre de pé, se precisam de mim, nunca virei a cara, mesmo que a virem, a mim. Até quando, desconheço, mas sei que um dia também eu cairei de vez e morrerei em paz, comigo mesma, sejam quais forem as condições em que isso aconteça.
Este meu novo conto de Natal pode não fazer sentido para quem acha que só acontece aos outros, que o mundo não gira, que a descida é estonteante e a nova subida, pode nunca mais acontecer. Eu consegui mas muitos não tem preparação psicológica para tal. Pode, também, nunca ser publicado em livro, mas, até, pode fazer parte de uma qualquer das minhas histórias, ou dos meus versos.
Neste meu novo Conto de Natal, o que é parte integrante dele, é uma insurreição silenciosa e que por vezes, basta um clique, para que atice em mim a necessidade de transpor em palavras cruas e desvirtuada para a época, aquilo que me aflige. O politicamente incorreto é a ferramenta de trabalho de um poeta que se preze, num país que tão maltrata os que lhes alimentam as mágoas, lhes iluminam o espirito, ou lhes apaziguam a revolta dos dias. Na maioria das vezes sem recolher dividendo algum, a não ser o breve direito a sorrir, por parte de quem lê, vê ou ouve. Nisso as redes sociais fazem milagres.
São eles, os poetas deste país, os músicos deste país, os pintores deste país, bailarinos, cantores, fadistas, os Atores deste país e tantos outros que fazem da arte passatempo. A arte em Portugal está dotada ao quase passatempo, mesmo que a tempo inteiro. Somos nós, os dotados de alguma partícula de arte, Os Bobos modernos Deste País, somos os que alimentam à conta do suor do rosto, de muitas horas de trabalho e meditação, de estudo e clausura, nos palcos mais ou menos encenados, os cordeirinhos deste país, com o brilho da arte, somos também, os que morrem sem palco, subindo ao palco na revolta da morte, quando já não carecemos desse mesmo palco.
Neste meu novo Conto de Natal sublinho de semblante carregado a vergonha em que esta quadra se transformou, as barrigas emproadas nos jantares e almoços, nos consertos e até nas ruas iluminadas. Convite ao consumo desmensurado, num país a morrer de velho, em que que a reforma é quase aos sessenta e sete anos e o rendimento mínimo é dado, em muitos casos, a pessoas com braços em condições de trabalhar, e cortado a quem dele necessita, incapacitado pela doença, desemprego, ou outra qualquer limitação prolongada.
Neste meu novo Conto de Natal sublinho que em 2019, apenas, pouco mais de um por cento do orçamento de estado foi para a cultura, que os clubes de futebol também continuaram a ser subsidiados, os teatros e os cinemas estão vazios, ou foram fechados, e os estádios continuam cheios.
Neste meu novo Conto de Natal a morte, ontem anunciada, de um Actor de sessenta e um anos, a cinco da reforma, sem trabalho e gravemente doente, que vi nos ecrãs, e morreu sem o mínimo de apoio moral, por parte de uma sociedade hipócrita, teve um peso redobrado. Sei que tinha uma filha, que a Segurança Social lhe cortou o rendimento mínimo e que deram por ele, morto, numa tenda em Sintra, junto à estação do comboio.
Neste momento esboço um sorriso esverdeado, já que o verde para além de ser a cor da esperança é também, a cor das tendas que tem alimentado as notícias e os nossos corações, complacentes, na aflição da desgraça alheia, nos últimos tempos. Tendas serão sempre abrigos precários e Jesus também nasceu na frieza de uma tenda. aqui chegada e como Cristã, dou por mim a pensar, a diginidade de morrer ou nascer no desprezo de uma tenda, é incalculavel.
Se a Senhora Ministra da Cultura, os técnicos da segurança social que cortaram o subsídio a este português, o restante governo e os nossos deputados que, perdoam dividas a banqueiros, conseguirem ir a todos os almoços e jantares, da quadra natalícia, para os quais são solicitados, sem uma ponta de pudor, Feliz Natal.


terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Dias Risonhos...


Ando arredada e sem rumo certo.
Deixo aos dias a supremacia do sol.
Quando fecho os olhos tudo é incerto.
E a ilusão é apenas um fraco lençol.

Caminho apressada, o fim está perto.
Dizem os ecos de um negro paiol!
O amor grita em ais: nada de concreto,
a Terra é fria e carece de um alto farol.

Quanto pesa a pressa nos meus olhos…  
Se passa por mim uma criança triste.
Um velho sem sol, uma mãe sem sonhos.

Quanto pesa ao peito os feios demónios…
Sempre que afirmo que se o frio existe:
É porque me esqueci dos dias risonhos!




Poesia falada, Mulher Alentejana.